segunda-feira, 18 de abril de 2011

Caridade

Na farmácia:
Várias pessoas na fila e um assistente de caixa cheio de espinhas em seu primeiro emprego pergunta conforme a menção decorada:
_ Gostaria de doar as moedas de seu troco para a AACD?
_ Claro!
Porque se não fica feio...

No semáforo:
_ Sr., ajude esse pobre aleijado!
_ Claro!
Depois de quase passar com carro em cima dele era o mínimo que poderia fazer.

No semáforo da frente:
_ Tio, arruma uma moedinha pra mim.
_ Claro!
Afinal de contas poderia ter sido chamado de mano ou truta.

No próximo semáforo adiante do anterior;
_ Vou lavar seu parabrisa...
_ Mas não precisa, está limpo...
_ Então me arruma uma graninha pro leite das crianças...
_ Claro!
Mas não para leite, e sim para a pinga que é pra esse diabo morrer mais rápido.

Chegando na garagem de casa:
_ Isso é uma assalto!
_ Claro! Mas já me levaram tudo, sobrou nada.

E para mim também não sobrou nada...

Mística

Acordei querendo morrer mas levantei.
Assustei o sono com um copo de café.
Tentei relembrar tanto e quanto sonhei
Mas esqueci jogando sal grosso no pé.

Acendi uma vela violeta ao anjo de guarda,
e fiz uma simpatia contra a mal retaguarda.

Mas cheguei ao quintal e ali estava:
Uma vela preta e uma vassoura levantada!
Ortogonal, não encostava em nada...
O encosto a sustentava, mas isso não prova nada...
Porque antes de mais nada
era só uma vassoura levantada.
Normal e ortogonal.

Cotidiano

_ Olá, amigo, por onde andou? Sumiu...
_ Cara, fui abduzido!
_ Por naves e ets?
_ Não.
_ Pela filosofia estóica?
_ Não.
_ Pela televisão?
_ Não.
_ Por alguma paixão feroz?
_ Não.
_ Amor?
_ Não...
_ Pela política?
_ Não.
_ Pela música?
_ Não.
_ Pela metafísica?
_ Não.
_ Então desisto... Foi pelo quê?
_ Pelo trabalho.
_ Ah... Larga mão de ser mentiroso, sô!

Ilusão de ótica

Foi assim...
Parecia estar subindo quando na verdade estava descendo...
Eletromagnetismo e coisa e tal.
Mas aí, vinha vindo eu pedestre normal pela praça,
e avistei um rato, isso um rato!
Como poderia aquele rato estar ali?
Que catástrofe sanitária dessa cidade insana!
Fui me aproximando do rato,
não sei se pensando matar ou apenas observá-lo...
Mas aí não era um rato,
apenas um pedaço de bombril 1001 utilidades
sendo arrastado pelo vento.
E só.

Bradicardia


Comendo mangas e manchando mangas longas,
Ouvindo sons dos tiros e dos motores aspirados..
Inspirado por sabores insossos e sombrios
Como se não houvesse mais nada
Como se não houvesse mais vida,
Assoprei o pó e as cinzas de volta ao passado.

Escutei mais tiros, logo, ainda estou vivo...
Mas é mais seguro distanciar-se dos tiroteios,
Para o pouco tempo passar mais devagar.