Nesta noite (ou não sei se foi na outra), algumas lembranças açoitaram meu inconsciente trazendo de presente fotografias borradas em simbólicos sonhos.
Começaram a flutuar, sob meus olhos cerrados, imagens minhas nos primeiros tempos de escola e dos amigos imaginários quando vinham brincar comigo.
Aquela antiga carteira de escola toda riscada de símbolos universais, o caderno de recordações na despedida da quarta série, a vergonha de chamar a professora da quinta de tia, as filas por ordem de tamanho, a hora da sopa... E parecia que a escola era tão grande!
O cheiro da manhã no interior, a segurança de tão jovem poder caminhar sozinho, as brincadeiras e brigas com meus irmãozinhos (que já estão se formando...).
Quando paro pra refletir nem parece que era eu... Embora me lembre claramente das maneiras como reagia ao desconhecido e inusitado, e talvez não tenha mudado muito... Inclusive no fato de que sempre quando me olho pelo espelho ainda não achar que eu sou eu mesmo.
Lembro das mentirinhas contadas mais por força da imaginação que por maldade, das mocinhas correndo com seus vestidos azuis e um aventalzinho escrito o nome... Minha lancheira do Rambo, aquele gostinho do suco tang que ficava na garrafinha... O recreio que separava garotos de garotas... Época épica da minha história. Lembro que na segunda série, o livro didático de português se chamava “As mais Belas Estórias”, sendo que a palavra estória, que tinha significado imaginário, desapareceu, ficando apenas a história.
Creio que de maneira geral, temos boas lembranças daquilo que nos divertiu; mas depois de certo tempo, nossa maturidade também vai nos fazendo sorrir frente ao que um dia nos fez chorar.
Talvez o peso das responsabilidades seja contrabalanceado pelo nosso tempo restante, que por diminuir tão rapidamente vai aliviando a carga e resgatando um equilíbrio aparente.
Percebi que entendimentos filosóficos às vezes são frios, e que quando se trata de felicidade, as coisas fantásticas, fabulosas, imaginárias... contam tudo de maneiras mais reconfortantes. Não se trata de dizer a verdade sempre, mas às vezes o que se deve ouvir.
Esses dias passei por um canal audiovisual que continha um pregador analisando a resposta de transeuntes quanto a pergunta: “omissão é mentira?” Uma me chamou a atenção. Uma certa senhora disse que omissão é mentira sim, e portanto um comportamento desonroso. Mas tem gente que mente por vergonha, o que implicitamente contém uma verdade que reconhece mas não quer expor. Outros mentem por autoproteção... E por aí vai.
Sei que relendo atentamente o caderno de recordações da quarta série, e procurando nos famosos sites de relacionamentos aqueles(as) colegas, percebi maior sinceridade na espontaneidade dos erros de português daquela época que nas falsas felicidades empacotadas em imagens e frases de seus perfis atuais.
Mas então retomo a ideia de que o que faz a felicidade é a diversão, e que às vezes não é pecado contar mentirinhas para vivermos melhor; e talvez omitir nossa tristeza seja uma maneira honrada de agradecer a vida e a saúde que possuímos, antes de mais nada. O resto é filosofia.
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