terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Dedim de prosa - Parte 04 (continuação da publicação do dia 16/02/2011)


Zóio, nosso herói esotérico teve um surto nacionalista ao modo de Policarpo Quaresma e Macunaíma, e resolveu reescrever a estória conforme o regimento governamental ainda atuante no Brasil, no estilo de “O Bem Amado” do Dias Gomes.

Isso resultou no retorno semântico do “Brazil” ao Brasil com “s”. Dessa forma, a todos que se sentiram incomodados, está resolvido o problema.

Assim, Zóio, o Herói Esotérico do Brasil, saiu voando com suas asas de segunda mão, em posse de seu novo equipamento de ampliação da visão tentando enxergar seu próprio coração.

Eram óculos escuros, e Zóio resolveu dar um passeio no deserto mais próximo, o sertão do Brasil.

Durante sua retirada de 39 dias no deserto, não fez jejum. Pousou em vários bares de copos sujos e degustou todos tipos de cachaça que encontrou. Mas na hora que achou uma cervejinha chamada Brahma (que também “desce redondo”), o “bip” invisível de seus óculos mágicos disparou.

Acontece que apareceu no boteco um sujeito com cara de mal querendo um metro de pinga. Mas tinha que ser um metro de pinga. Esse sujeito sacou um facão da bainha e fez um risco no balcão... E Zóio só de zóio...

Depois da pinga colocada, o sujeito com cara de mal maniado com a ideia de jagunço pediu um canudinho e começou a chorar bebendo tristemente seu metro de pinga...

Zóio ficou com pena do jagunço cangaceiro meio afeminado e foi conversar um pouquinho com o rapaz.

Havia uma fresta no pau-a-pique por onde penetrava um raio luminoso que, rodeado pela sombra, formava um cone onde a poeira se destacava em partículas quase microscópicas.

O jagunço começou explicar que tinha sido criado pela finada avó Damiana, e que o figurino foi a única herança que lhe sobrou de toda sua miséria. Na tentativa de minimizar a culpa e virar homem de verdade (como sua avó sempre lhe sugeria), resolveu sair matando moscas no sertão, e tomando umas pingas pra tomar coragem de fazer esse grande mal.

Zóio, tomado de súbito despertar da consciência, tendo seu chacra coronário iluminado pela pouca luz que rasgava as sombras do bar de pau-a-pique e enxergando o coração meio rosa do jagunço pingaiada, começou sua retórica acerca do universo.

_ Tá vendo essa cerveja?

_ Claro, não sou cego, seu vesgo!

_ Olha como fala: afinal eu sou o Zóio, o Herói Esotérico do Brasil.

_Que que tem essa cerveja?

_ Então, ela se chama Brahma.

_ E...

_ Brahma é o Deus esotérico que representa o potencial da força criadora ativa no universo.

_ Sei... Então quem bebe cerveja bebe também a força criadora do universo?

_ Uai, de certa maneira, e se não dirigir bêbado, acho que sim... Pergunta difícil, sô...

_ Mas de que isso me interessa? Olha o facão!

_ Vou te contar uma história... Brahma é representado com quatro cabeças, mas originalmente, era representado com cinco. De acordo com os mitos, ele possuía apenas uma cabeça. Depois de cortar uma parte do seu próprio corpo, Brahma criou dela uma mulher, chamada Satrupa, também conhecida como Sarasvati. Quando Brahma viu sua criação, ele logo se apaixonou por ela, e já não conseguia tirar os olhos da beleza de Satrupa. Naturalmente, Satrupa ficou envergonhada e tentava se esquivar dos olhares de Brahma movendo-se para todos os lados. Para poder vê-la onde quer que fosse, Brahma criou mais três cabeças, uma à esquerda, outra à direita e outra logo atrás da original (não é a cerveja Original não...). Então Satrupa voou até o alto do céu, fazendo com que Brahma criasse uma quinta cabeça olhando para cima, e foi assim que Brahma veio a ter cinco cabeças. Da união de Brahma e Satrupa, nasceu Suayambhuva Manu, o pai de todos os humanos.

_ Nossa que história linda! Mas o que eu tenho com isso, seu zaroio?

_ O Sol não escolhe quem iluminar. Ele busca a beleza da criação em todos os lugares, dispersa sua luz para todos, não havendo, pois, para ele, nenhuma diferença entre todos os seres vivos que buscam sua essência. Para esse Sol que nos dá a vida, sendo esse Sol nada mais na menos que o coração de um grande anjo, todos são iguais, e o egoísmo é o sentimento de existir. Siga seu caminho conforme seu coração, e pare de matar moscas para parecer macho...

_ Sério, mas como pode ver que o Sol é um anjo?

_ Por causa desses óculos especiais que o irmão dele me deu.

_ E por que usa essa capa preta?

_ Pra esconder minhas asas... Mas mudando de assunto, por que não tira essa roupa de cangaceiro e liberte as asas da sua imaginação?

_ SIM!

E assim, o jagunço afeminado atirou para o alto suas tralhas de miséria de vontade e representação e, como não havia rosas, saiu beijando os cactos, porque o que importa na moral da história são os espinhos (embora nas rosas sejam acúleos, anexos epidérmicos).

Depois da missão cumprida, Zóio pediu mais uma cerveja Brahma “saidera”, e fez um um brinde ao coração Sol que a todos ilumina...

As aventuras de Zóio, o Herói Esotérico do Brasil com “s” continuam...